Desperdício alimentar e excesso de peso são as consequências de uma má gestão na cozinha das famílias portuguesas

 

Faltam 4 anos para cumprimos os objectivos do Movimento 2020

  • 72,7% das famílias não elabora ementas para as refeições semanais
  • Apenas 30,3% dos inquiridos concorda totalmente com a afirmação “Ajudo as crianças a seleccionar os alimentos no momento da compra”

Há exactamente 2 anos, no dia 15 de Maio de 2014, celebrava-se o Dia Internacional da Família, bem como o início de um percurso de 6 anos para o cumprimento dos 20 objectivos propostos pela Associação Portuguesa de Dietistas no âmbito da Saúde Alimentar. O Movimento 2020 surgiu assim da vontade de se provocar uma transformação, crescimento e mudança na comunidade científica e no cidadão, tendo um plano de actividades a 6 anos que envolve desde formação em centros de saúde, hospitais e escolas, palestras, aconselhamento, discussão de temas na Assembleia da República, entre outros. Tem o apoio do Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Saúde e conta com diversos parceiros das áreas da saúde, agricultura, responsabilidade social, indústria, Sector Alimentar, etc.

Para melhor compreender os hábitos alimentares dos portugueses, o Movimento 2020 elabora com alguma frequência levantamentos de dados junto do cidadão. Durante Abril e Maio, o objectivo de um novo inquérito realizado a 590 indivíduos com idade igual ou superior a 18 anos, divididos entre o sexo masculino e feminino, sendo a mediana do número de elementos que compõem o agregado familiar da amostra de 3 elementos, com o valor mínimo de 1 e o máximo 5 indivíduos. Teve a participação de indivíduos de norte a sul, com representação de todos os distritos, incluindo ilhas, tendo a maioria registada sido de Lisboa (50,8%), seguido de Setúbal (10%) e Porto (8,6%). 69,5% dos inquiridos possui habilitação literária ao nível do ensino superior, enquanto 22,5% tem o 12º ano.

Quando questionados sobre se fazem lista de compras, 74,2% dos inquiridos responde afirmativamente. No entanto, mais mulheres (75,2%) do que homens (67,3%) fazem lista de compras. Das 438 pessoas que fazem, 34,3% dizem que faz a lista sozinho, 28,8% faz com filhos ou pais e 25,6% com cônjuge, colega de casa ou companheiro. Fazendo uma análise por género, são mais as mulheres que referem que vão sozinhas (36,4%), do que os homens (15,9%). 43,2% dos homens refere ir às compras com cônjuge, companheira ou colega de casa.

No entanto, quando questionados sobre a elaboração de ementas para as 14 refeições principais da semana, 72,7% responde que não o faz. Analisando por género, é interessante perceber que é maior a percentagem de homens (28,6%) do que as mulheres (27,2%) que refere fazer ementa.

Destas pessoas, 46,6% refere fazer a ementa sozinho, enquanto 17,4% refere fazê-la com filhos ou pais e 24,2% com cônjuge, companheiro ou colega de casa. Fazendo a análise por género, 50% das mulheres fazem a ementa sozinhas, enquanto apenas 23,8% dos homens refere fazer a ementa sozinho; nos homens, 47,6% diz fazer a ementa com cônjuge, companheiro ou colega de casa.

Quanto à frequência com que fazem as ementas, 40,4% dos 161 inquiridos que faz ementas refere fazê-lo diariamente, enquanto 54% faz ementa semanalmente. A análise por género mostra que 59,3% das mulheres faz ementa semanalmente, enquanto 71,4% dos homens refere fazê-la diariamente.

Para Zélia Santos, nutricionista e Membro do Conselho Executivo do Movimento 2020, “analisando estas primeiras questões, verifica-se que, apesar da maioria dos inquiridos elaborar lista de compras, existe um gap muito grande entre a percentagem de pessoas que faz lista de compras e a que elabora as ementas para as refeições que faz em casa. Esta questão pode relacionar-se com o facto da população inquirida ter, já, conhecimentos acerca da importância da elaboração de uma lista de compras numa alimentação equilibrada e sustentável, mas de ainda não ter a noção da importância da realização das ementas para uma melhor gestão da matéria-prima necessária à realização das refeições, tendo consequente impacto no desperdício alimentar realizado pelas famílias.

Em resposta à questão “Levo crianças quando vou adquirir produtos alimentares”, obtém-se uma média de respostas de 2,39, significando que, em média, os inquiridos discordam com o exposto. Zélia Santos refere que, “apesar da DGS defender que levar as crianças às compras é uma prática a evitar, o Movimento 2020, atuando com base na crença de que os valores da Dieta Mediterrânica de inclusão de toda a família, não só no momento de refeição, como no processo de aquisição, preparação e confecção das refeições, defende que os adultos/pais devem ser informados e integrar ao máximo as crianças nas escolhas alimentares da família, sendo agentes ativos na educação alimentar das crianças, de forma a promover o ganho de competências e conhecimentos nestas áreas”. Fazendo uma análise por género, 39,9% das mulheres inquiridas referem que discordam totalmente da afirmação, enquanto apenas 26,5% dos homens referem discordar da mesma. Relevante ainda referir que 24,5% dos homens não concorda nem discorda com a afirmação.

Ainda sobre a ajuda dos filhos nas compras, 30,3% dos inquiridos discorda totalmente com a afirmação “Deixo as crianças escolher os alimentos no momento da compra”. Analisando por género, 73,5% das mulheres e 63,3% dos homens discorda com a mesma. Apenas 30,3% dos inquiridos concorda totalmente com a afirmação “Ajudo as crianças a seleccionar os alimentos no momento da compra”. Analisando por género, 45% das mulheres e 40,9% dos homens concordam com a frase.

Apenas 26,1% dos inquiridos concorda totalmente com a frase “Procuro ensinar às crianças o que comprar”. Também apenas 29,6% dos inquiridos concorda totalmente com a frase “Explico às crianças porque não devem comprar certos alimentos”, não havendo diferenças entre os géneros.

Relativamente à afirmação “Tenho a preocupação de ensinar as crianças a cozinhar”, a análise à mediana permite verificar que a maioria não concorda nem discorda com esta afirmação (mediana 3). Ainda assim, ao analisar as respostas de quem discorda da afirmação, 34,6% das mulheres e 34,7% dos homens referem discordar totalmente com a mesma.

Para Zélia Santos, “se verificarmos as análises realizadas a todas as afirmações, verificamos que não é unânime para os inquiridos a importância de ajudar as crianças na selecção de produtos alimentares, de ensinar o que comprar e de explicar por que não se deve comprar certos alimentos. Além disso, a maioria não deixa as crianças escolher produtos alimentares no momento da compra, privando-as de praticar aquilo que lhes é ensinado em teoria. Embora este fenómeno possa estar ligado a uma tentativa de economizar tempo no momento das compras e a evitar situações de confronto com as crianças num espaço público, é importante ter em conta que a exposição das crianças a este tipo de ambientes é necessária para que possam ganhar competências e conhecimentos ao nível da aquisição dos produtos alimentares, tendo influência na sua capacitação e escolhas alimentares na adolescência e idade adulta.

Quando se pergunta “Quantas pessoas do seu agregado familiar sabem cozinhar?” a mediana é 2, significando que, na maioria dos casos, 2 pessoas sabem cozinhar no agregado familiar. Analisando por género, as mulheres referem que, nos seus agregados familiares, 2 pessoas sabem cozinhar, enquanto que os homens referem 3.

Relativamente ao número de pessoas envolvidas em simultâneo na preparação e confecção de refeições, a maioria dos casos refere que, habitualmente, envolvem-se 2 pessoas em simultâneo nestas tarefas em casa. Analisando por géneros, à semelhança da resposta anterior, as mulheres referem que são 2 pessoas nos seus agregados familiares a tratar da preparação e confecção das refeições em simultâneo, sendo que os homens referem 3.

Segundo a nutricionista “parece haver uma descontinuidade entre a aquisição, preparação e confecção das refeições em família, no sentido em que, havendo conhecimento relativamente à necessidade de envolver a família nas várias etapas relacionadas com a alimentação, não há prática dos conhecimentos. Esta situação é preocupante porque o envolvimento de toda a família no processo é a forma mais eficaz de transmissão de conhecimentos e competências ligadas à alimentação, permitindo a prática de uma alimentação equilibrada e promotora de saúde. Lembre-se que a elevada prevalência de excesso de peso e obesidade quer na infância, quer em idade adulta, se relaciona directamente com a prática de um estilo de vida inadequado, no qual se inserem hábitos alimentares desajustados.” 

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